A deliciosa história do chocolate é contada neste artigo escrito pela chef confeiteira Tatiane Santos. Professora da Unimep (Universidade Metodista de Piracicaba), confeiteira de mão cheia e uma simpatia de pessoa, ela escreveu alguns artigos que serão publicados ao longo desta semana. Você sabia que o chocolate já foi usado em sacrifício e também como moeda de troca? E que sua disseminação dependeu de uma estratégia de marketing?
A chef explica tudo isso pra gente em um texto delicioso de ler.
A SAGA DO CHOCOLATE E O EMPURRÃOZINHO DO MARKETING
* Por Tatiane Santos
Talvez você já tenha refletido sobre o quão importante pode ser uma embalagem. Ela pode tornar um produto mais atraente e interessante a quem o flerta e assim, aumentar seu valor – tanto o valor monetário quanto o carnal, ou seja, o desejo. Pois bem, o chocolate, produto hoje nobre, produzido e apreciado por diferentes paladares também teve em sua saga uma espécie de empurrãozinho do marketing.
Essa história começa no golfo do México, precisamente nas florestas tropicais úmidas do litoral de Honduras de onde esse fruto é nativo. Lá, descoberto pelos Olmecas, que o consumiam como uma bebida amarga já 1.200 a.C., foi também cultuado por outras civilizações mesoamericanas até ser, entre 1.000 a.C. e 1.000 d.C. desvendado pelos Maias, que com seu notável desenvolvimento cultural e agrícola conseguiram produzir o cacau próximos às suas cidades e assim usufruir desta relíquia com mais facilidade.
Este saboroso domínio do povo Maia sobre a produção do cacau para sua preciosa bebida, o xocolatl ou chocoatl (água amarga) – como chamavam- perdurou até por volta do século XIV, quando os Astecas, guerreiros nômades descendentes de povos conquistadores da mesoamérica dominaram as cidades Maias e se apropriaram de todas as riquezas desse povo, desde sua cultura, construções e produtos.
O chocolate, sempre consumido como bebida (esta forma de consumo só mudaria no sec. XVIII, após a Revolução Industrial), era apreciado por seu sabor, pela capacidade que possuía de fazer espuma, ou seja, emulsionar, e pela energia, pela sensação de vigor que dava a quem o ingeria. Estas características eram muito apreciadas pelos Astecas. Conta-se que o imperador Asteca Montezuna II, no séc. XVI foi o maior fã da bebida. Dizem as lendas – assim consideradas, pois não existem registros históricos precisos – que Montezuma mandava deixar à sua disposição mais de 50 potes de ouro cheios de chocolate e que dispunha, aos funcionários de seus templos, 3.000 litros de chocolate diariamente. Montezuma também tornou oficial o consumo da bebida entre os nobres. O chocolate era utilizado em sacrifícios e o cacau, a principal e mais valiosa moeda de troca. Tudo isso deu a Montezuma II o título de “o imperador do chocolate”, posição que o destacou historicamente, e que ao mesmo tempo aniquilou toda a civilização Asteca.
Ocorre que em 1519, o navegador espanhol Fernão Cortez aportou no golfo do México. Na ocasião, o povo Asteca aguardava exatamente para aquele ano, o retorno de seu Deus, Quentzalcóatl, que para eles reencarnava e voltava a seus domínios em períodos determinados. Pois bem, a “embalagem” de Fernão Cortez o ajudou. Ao chegar em lindas vestes e em grandes caravelas, este europeu deu ao imperador Montezuma a certeza de que ele era a reencarnação do deus Quentzalcóatl e assim, Cortez foi recebido pelos Astecas com o que aquele povo possuía de melhor. Foi preparado um magnífico banquete, que dizem, durou um mês e onde foram servidas centenas de aves, caças, peixes e para beber, foi servida a Cortez em taças de ouro a mais preciosa das bebidas, o chocolate (em metal de irrelevante valor comparado ao produto que continham). Vivendo certo tempo com os Astecas, Fernão Cortez apreendeu o valor do chocolate e foi com esta conotação que levou o produto para a Europa.
Chegando com um bom marketing foi um tiro certeiro. O consumo do chocolate foi rapidamente incorporado aos hábitos da nobreza e posteriormente, seu preparo acrescido de açúcar, produto já existente na Europa na ocasião e agradando assim ainda mais paladares. Mais adiante, com o advento das máquinas, o consumo da bebida foi disseminado, estendendo-se aos burgueses e depois, a criação das barras (uma outra hilária história) foi apenas conseqüência do desenvolvimento industrial.
Talvez você se pergunte – e sua dúvida seria verdadeira – por que Cristovão Colombo, que uns vinte anos antes já tinha feito uma visitinha ao continente não encontrou o chocolate? Pois esta é a outra grande ajudinha do marketing neste caso. Quando Colombo esteve na América ele encontrou e levou o cacau à Europa. Porém, como mais uma das centenas de exemplares sementes que recolheu. E quando chegou lá, aquela castanha dura e sem aroma (como ela é antes da torra), não despertou nenhum interesse. Percebem? Todo produto pode mudar a depender de como é apresentado, ou melhor, de sua embalagem.
Há, e antes que eu deixe de concluir com Cortez e os Astecas… demorou cerca de um ano até o imperador Montezuma II perceber que Fernão Cortez não era a reencarnação de seu Deus Quentzalcóatl. Mas Cortez, com muita astúcia também percebia que estava sendo descoberta sua verdadeira “persona”. Então prontamente Cortez preparou um grande ataque que levou, após alguns dias de combate, ao extermínio total do povo Asteca, não restando ninguém para contar a história, apenas é claro o delicioso chocolate, que aqui está para lembrá-la.
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